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O que é?

Definir tráfico de animais silvestres pode parecer algo simples, que não exige muito esforço nem tampouco grande conhecimento. Mas, provavelmente, a maioria das pessoas não é capaz de formular uma definição completa ou bem abrangente.

A definição de tráfico de fauna, no Brasil, não está consolidada em lei. Pode parecer estranho, mas essa atividade criminosa, uma das mais rentáveis do mundo, inexiste como um tipo penal na legislação nacional.

O tráfico de animais silvestres é um encadeamento de atividades envolvidas no comércio sem autorização do poder público de animais vivos, suas partes (peles, garras, presas, penas, ovos, peçonhas, etc.) e de subprodutos feitos com essas partes, como peças de vestuário e de decoração e poções e pomadas usadas como remédios. Assim, quem captura ou coleta, transporta, armazena ou vende é traficante de fauna.

Dependendo da fonte de consulta, esse crime é apontado como a terceira ou quarta atividade ilícita mais lucrativa do mundo. Os outros são o narcotráfico, o comércio ilegal de armas, a falsificação de produtos (pirataria e moeda) e o tráfico de humanos. São cifras que anualmente, em todo o globo, variam de 7,8 bilhões de dólares (WWF, 2012), passam por 10 bilhões de dólares (WWF-Brasil, 1995), 23,3 bilhões de dólares (Parlamento Europeu, 2016) e chegam a 25 bilhões de dólares (Global Financial Integrity, 2011).

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É importante ter em mente que o hábito de criar animais silvestres como bichos de estimação é uma
questão cultural e que deve ser desestimulada em qualquer planejamento sério e responsável que
intencione combater o tráfico de fauna.

E o Brasil?

O Brasil é apontado como responsável por movimentar entre 5% e 15% de todo o tráfico de
vida silvestre (fauna e flora) no mundo.

38 milhões. Esse é o número de animais silvestres retirados da natureza brasileira todos os
anos para abastecer o tráfico de fauna, de acordo com estimativa de 2001 da ONG Rede
Nacional de Combate ao Tráfico de Animais Silvestres (Renctas).

É importante destacar que esse número está subestimado, pois, no cálculo da Renctas, não
foram levados em conta os peixes e os invertebrados. Há também uma grande possibilidade
de o tráfico ter aumentado após a divulgação do dado. Vale salientar o fato de que essa forma
de comércio de animais, por ser ilegal, nunca será dimensionada quantitativamente com
exatidão.

Há vários tipos de tráfico de fauna. Tendo como referência o
destino dado ao animal, é possível identificar as seguintes
categorias:

  • estimação: principal do Brasil, caracterizada pela venda de animais em feiras e internet para serem criados como pets;
  • coleção: envolvendo animais raros para colecionadores e zoológicos;
  • criadouros/lojas: animais ilegais são marcados e identificados para parecerem ter origem legal, principalmente em criadouros comerciais, criações amadoras de pássaros e pet shops;
  • biopirataria: animais ou substâncias que produzem são enviados para pesquisas em laboratórios e para indústrias; e
  • confecção de produtos: partes de animais são comercializadas para serem transformadas e vendidas como mercadorias.
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O comércio ilegal de fauna no Brasil: uma
problemática nacional

Deve-se destacar que 60% (segundo publicação da Fundação SOS Mata Atlântica e da Renctas de 2005) ou 70% (de acordo com WWF-Brasil em relatório de 1995) do tráfico de fauna no Brasil está voltado para abastecer o mercado interno, ou seja, para suprir a demanda dos próprios brasileiros por animais. A criação de animais silvestres como bichos de estimação é o principal motor do comércio ilegal de fauna no país.

A quantidade de animais silvestres mantidos ilegalmente em cativeiro é desconhecida. Espalhados por todo o país estão papagaios em poleiros, pássaros em gaiolas e macacos em correntes.

As pesquisas são unânimes em afirmar que mais de 80% dos animais traficados no Brasil são aves, com destaque aos Passeriformes (aves pequenas, de bela plumagem e canto atraente, popularmente conhecidos como passarinhos) e os Psitaciformes (papagaios e araras).

Os estados das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste são, em linhas gerais, “fornecedores” de animais para grandes centros de “consumo” do Sul e do Sudeste. Mas não se deve ignorar o intenso comércio existente, por exemplo, nos centros urbanos nordestinos – fenômeno não totalmente dimensionado em pesquisas.

Tradicionalmente, o tráfico de fauna no Brasil teve nas chamadas “feiras de rolo” (comércio de rua com alto grau de informalidade realizado em fins de semana em muitos municípios do país) um de seus maiores palcos de desenvolvimento. Com o aumento da fiscalização, essa forma de comércio passou a ser menos ostensiva e ainda ganhou a concorrência do tráfico pela internet, com destaque para redes sociais e grupos formados em aplicativos de troca de mensagens.

Leia mais sobre as leis de combate ao tráfico de animais

Leis

A principal peça legal para o combate ao tráfico de animais silvestres é a Lei de Crimes Ambientais (nº 9.605, de 12 de fevereiro de 1998), que estipulou no artigo 29:

“Matar, perseguir, caçar, apanhar, utilizar espécies da fauna silvestre, sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente, ou em desacordo com a obtida:

Pena – detenção de 6 (seis) meses a 1 (um) ano, e multa.”

Parágrafo 1º – Incorre nas mesmas penas:

(…) Inciso III – quem vende, expõe à venda, exporta ou adquire, guarda, tem em cativeiro ou depósito, utiliza ou transporta ovos, larvas ou espécimes da fauna silvestre, nativa ou em rota migratória, bem como produtos e objetos dela oriundos, provenientes de criadouros não autorizados ou sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente.

Parágrafo 2º – No caso de guarda doméstica de espécie silvestre não considerada ameaçada de extinção, pode o juiz, considerando as circunstâncias, deixar de aplicar a pena.”

Também é aplicado o artigo 32 da mesma lei:

“Praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos:

Pena – detenção de três meses a um ano, e multa.”

Pelo fato de as penas para esses crimes serem inferiores a dois anos (“menor potencial ofensivo”), eles são submetidos à Lei nº 9.099/1995, que dispõe sobre os Juizados Especiais Cíveis e Criminais e abre a possibilidade da transação penal e a não abertura de processo judicial.

Agrava a situação a Lei nº 12.403/2011, que estabeleceu o fim da prisão preventiva para crimes com penas menores que quatro anos de prisão, como o de formação de quadrilha.

O tráfico de animais silvestres é o crime da impunidade.

Policiais mais compromissados com o combate ao tráfico de fauna buscam alternativas. Alguns delegados, no lugar de se basearem no artigo 29 da Lei nº 9.605/1998, preferem o artigo 180 do Código Penal (Decreto-lei nº 2.848, de 07 de dezembro de 1940).

“Artigo 180 – Adquirir, receber, transportar, conduzir ou ocultar, em proveito próprio ou alheio, coisa que sabe ser produto de crime, ou influir para que terceiro, de boa-fé, a adquira, receba ou oculte:

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Consequências do tráfico

O tráfico de fauna é responsável por problemas ambientais e de saúde pública, por crueldades contra os animais e por onerar os cofres públicos.

Todo animal tem funções ecológicas a cumprir em seu ecossistema. A retirada constante de indivíduos de uma mesma espécie pode levar a extinções locais ou totais, além de afetar outras espécies (inclusive da flora) com que ela se relaciona – seja por predar ou ser predada, por disseminar sementes, polinizar, etc. É real a possibilidade de as capturas e as introduções de animais gerarem desequilíbrios em ecossistemas.

O comércio ilegal de animais também está intimamente envolvido com a disseminação de zoonoses (doenças transmitidas pelos animais aos humanos). Mais de 200 zoonoses já foram identificadas, valendo destacar, por exemplo, a febre amarela, a tuberculose, a toxoplasmose, a gripe aviária, a raiva e a psitacose, sem esquecer da recente pandemia de Covid-19. Esse tipo de crime é, portanto, um grande problema de saúde pública e para os cofres públicos, que têm que investir no atendimento médico da população e na estrutura de fiscalização e suporte para animais apreendidos.

Por fim, os traficantes de fauna são responsáveis por um leque de ações cruéis para garantir seus lucros. Animais são dopados, machucados na coleta ou captura, transportados amontoados em pequenos espaços, sem ventilação, alimentação ou água. O estresse é intenso, causando queda de imunidade. Lesões e mortes são muito comuns.

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Posição do Fauna News

O Fauna News é contra todo e qualquer comércio de animais silvestres com finalidade de abastecer o mercado de bichos de estimação. Essa postura inclui a atual criação comercial legalizada.

Também somos contra a criação amadora de pássaros (Passeriformes), que hoje é autorizada pelo poder público.

Ao autorizar a criação de animais silvestres como pets, o Estado brasileiro está reforçando a cultura responsável por movimentar o tráfico de fauna no país e uma atividade cruel.

Animais silvestres não passaram pelo processo de domesticação e sofrem em cativeiro. Eles são impedidos de expressarem os comportamentos naturais das espécies a que pertencem, como voar, socializar, acasalar, etc., o que os compromete fisicamente e mentalmente. E, geralmente, os “donos” desses animais não têm informação suficiente para minimizar esses problemas.

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Como combater

O tráfico de fauna é complexo e tem de ser combatido com uma série de medidas. Em resumo:

  • programas de geração e substituição de fonte de renda para combater a pobreza nas áreas de coleta e captura;
  • repressão eficiente e sem corrupção;
  • legislação com punição severa, tipificando o crime “tráfico de fauna” e diferenciando as penas para quem cria sem autorização das penas para quem trafica;
  • educação ambiental, afinal sem demanda não há comércio; e
  • boa infraestrutura para o pós-apreensão, com:
    • técnicos para primeiros socorros aos animais durante as apreensões;
    • rede de centros de triagem e de reabilitação de animais silvestres (Cetras), que recebem, realizam os primeiros cuidados e dão destinação aos bichos, estruturada e preparada;
    • procedimentos eficientes para solturas (introdução, reintrodução e revigoramento populacional);
    • áreas para solturas credenciadas e espalhadas por todos os biomas; e
    • monitoramento pós-soltura para correção de rotas e aferição de sucesso de metodologias.
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